quinta-feira, 12 de junho de 2008

Gina em: Meus 15 anos

"Oh ! Que saudades que tenho

Da aurora da minha vida,

Da minha infância querida

Que os anos não trazem mais!

Que amor, que sonhos, que flores,

Naquelas tardes fagueiras,

À sombra das bananeiras,

Debaixo dos laranjais!"

Seu Casimiro



Romântico, Casimiro lembra com nostalgia dos seus 8 anos nesta poesia romântica repetida massivamente nas nossas saudosas aulas de literatura. O poeta realmente deve ter passado anos maravilhosos à sombra das bananeiras, debaixo dos laranjais, contudo, minha casa só tinha um ficus de plástico e um cachorro moribundo. A rima definitivamente não vai ficar boa.

Casimiros à parte, estou iniciando uma série de contos, crônicas e poesias dos meus 15 anos, quando eu achava que poderia um dia ser algum Machado de Assis (e acabei virando Gina...). Devaneios púberes de uma criança sonhadora. Naquela época, meus textos eram melancôlico, lacônicos, quase a beira do dramático suicídio poetíco. Hoje eu não me atrevo a falar "anátema social" "monólito" ando longe dessas cultisses de criança, quem sabe agora revistos os textos valham algum tostão furado. Enjoy!

Ferrugem de Velho

Naufragando em meio aos dejetos de um esgoto qualquer, em um canto sem nome no fim do mundo, passava por mim todo excremento da humanidade e um rio de lembranças passeavam no topo da minha cabeça grisalha.

Apertei um pouco a vista cansada e vi um brilho meio opaco, coberto de sombras e ferrugens flutuando ao meu lado, era um carro, novíssimo nos meus tempos de infância, agora todo roto.

Lembro-me da primeira vez que ouvi o ronco daquele automóvel. Era um caboclinho magrelo em todo minha doce indigência, eu brincava em meio ao matagal quando ouvi um ronco forte e estrépito. Lancei-me mata adentro, fechei os olhos, rezei um punhado de aves-marias até quando não pude mais ouvir silvo. Saí do mato e cherei seu rastro para ver que bicho era.

Se eu pudesse encontrar o sujeito que jogou aquela maravilha naquele putrefo rio, enchia-lhe a cara de bordoadas! Todo enferrujado daquele jeito e eu que passei a infância toda desejando encher meu rosto de poeira e fumaça no capô daquele carro.

Era lixo.

Lixo...Como o rádio que flutuava ao seu lado. Lembro bem quando o vizinho rico comprou o primeiro rádio da vila, eu olhava para o rádio e ele brilhava na íris dos meus sonhos. E toda aquela criançada reunida só para ver ouví-lo tocar. Foi a primeira vez que peguei piolhos!

E assim, enferrujado, descendo o esgoto ia televisão, rádio, computador, i-pod, os ossos da Dolly, a correnteza íngreme e inerte dos meus sonhos se esvaindo, o coração batendo fraquinho... Fraquinho... Pressão arterial baixa, dor na coluna, reumatismo, osteoporose, enferrujando junto a todas aquelas coisas.

Quando nasci, minhas tias arracavam-me as bochechas em apertões e sorrisinhos , mau de caçula, era aquele espanto do novo, do silvo do carro, do brilho do rádio.Ninguém se atreveria a apertar minhas bochechas agora, um velho decrépito. Eu me tornei um monólito do passado, um anátema social.

Movi meus braços no sentido contrário a correnteza, meus ossos estalavam, resignei-me em toda minha decrepitude e desisti de lutar contra o sentido natural e assim como as rugas que desciam meu rosto, segui até o fim da trajetória. Um dia fui novo, agora sou um amontoado de sombras e ferrugens.

Aquele mesmo velho motor em decomposição.

2 comentários:

Anônimo disse...

Gina, minha cara, depois de ler esse texto e ver teu comentário, sinto-me compelido a concordar com vossa pessoa: verborrágico é mesmo uma palavra feia! Mas é um feio curioso, engraçado... sei lá... sabe como é, né... homem não pensa nessas coisas na hora.

E quanto ao "anátema social" e ao "monólito", tive que buscar no dicionário os significados - quem dera... saber palavras assim com 15 anos!!

Estou esperando os próximos capítulos.

Hasta.

Halina disse...

Eu me lembro desse texto... vc me deu pra ler... ou to variando das ideias?